Dois pesos, duas medidas, no TRE/SE

Publiciado em 12/10/2019 as 05:38

O governador Belivaldo Chagas foi cassado por 6x1 por abuso de poder político. Não foi por corrupção, nem por conduta vedada, mas por uma figura aberta. Foi cassado por um critério amplíssimo de interpretação, que considerou que atos administrativos de publicidade do início de obras públicas, feito em período permitido, caracterizariam ganho de capital para as eleições. Nenhum dos atos seria ilegal, mas o conjunto foi considerado um “abuso”. Ou seja: para a Justiça Eleitoral, o governador deveria ser inerte ou simplesmente não comparecer aos atos de sua administração. Ninguém referiu discursos, ninguém falou em pedido de votos nessa situação. Mas “deduziram” um proveito político. É inusitada essa leitura que condena a eficiência da gestão, a operosidade do governo e premia o sigilo na administração.

Condenado por critérios tão abertos, o governador só encontrou um voto divergente. O do juiz federal. Todo mundo sabe como a Justiça Federal se comporta com rigor extremo na verificação de ilegalidades. A divergência de um juiz federal, no caso, o Dr.Antonio Garapa, é um natural sinal de alerta.

A defesa do governador opôs o único recurso cabível no âmbito do TRE. Embargos de declaração. Assinalou que o julgamento continha omissões sérias e contradições evidentes. Uma delas seria a de que o número de ordens de serviço estaria no contexto de outros atos de gestão pública e que faltaria ao caso a delimitação precisa da gravidade capaz de comprometimento das eleições. Afinal, quem foi em Sergipe que acordou no dia seguinte às eleições achando que o resultado das urnas não foi limpo?

Nas eleições de 2014, quando Aécio Neves perdeu, ele pediu recontagem. Em 2018, Fernando Haddad disse que Bolsonaro abusou do whatsapp e de outras redes sociais. E, nos casos, muitos na sociedade civil fizeram eco. Quem, nas ruas de Sergipe, há um ano, disse que a eleição de Belivaldo foi viciada? Ninguém. Não há queixas disso, sequer na imprensa.

O TRE simplesmente entendeu por bem considerar abusivo aquilo que a sociedade, em seu conjunto, considerou normal.

Os embargos, por sua vez, foram pautados rapidamente, em velocidade bastante peculiar. No curso do rito, foi descoberto o fato de que o filho do desembargador José dos Anjos era desde agosto advogado do escritório que promoveu uma das ações movidas contra o governador.

Esse fato foi comunicado no processo, por meio do incidente próprio, chamado de arguição de impedimento. O desembargador José dos Anjos reconheceu que o fato era verdadeiro, mas não se entendeu por impedido, já que o filho não trabalhou no processo. No mais, entendeu que se alguém tivesse de se afastar do processo, seria o filho e seus colegas de escritório, não ele. O impedimento não poderia afastar sua participação no processo, nem anular o julgamento conjunto da ação promovida pelos colegas do seu filho e pelo Ministério Público.

Na tarde de ontem, o tribunal julgou duas causas do escritório em que está integrado o filho do desembargador José dos Anjos. Mas não com a participação dele, que reconheceu seu impedimento. Em seu lugar compareceu o Des. Roberto Porto, convocado para esse julgamento. Imediatamente a seguir, o tribunal apreciou a arguição de impedimento. Nos casos de Rodrigo Valadares x Vardo da Lotérica nem foi preciso apreciar. Isso foi reconhecido automaticamente.

A situação era a mesma: o escritório que defende Rodrigo é o mesmo da Coligação de Valadares Filho.

O TRE, no entanto, entendeu que não havia o impedimento para julgar o caso de Belivaldo Chagas, apesar de o fato de o filho do desembargador presidente advogar no escritório de uma das partes desde agosto, antes do julgamento da causa.

Dois pesos e duas medidas? O juiz federal Antônio Garapa reconheceu o impedimento. O jurista Joaby Gomes também. Mas quatro membros do Tribunal entenderam que não havia problemas.

Aí eu lhe pergunto, caro leitor, você aceitaria ser julgado pelo pai de um integrante do escritório do seu adversário de causa?

O governador fez muito bem em arguir a exceção de impedimento. Não colocou em xeque a reputação de um juiz correto como o Desembargador José dos Anjos. Apenas deu a ele a oportunidade de corrigir um fato que ele possivelmente ignorava.

O Tribunal, no entanto, renovou a maneira elástica de compreensão dos argumentos jurídicos. O que impede para umas causas, não impede para outras...

Com a palavra o TSE, que dirá quem tem razão nessa disputa.