Ex-aliados do PT no Nordeste viram casaca e apoiam Bolsonaro mirando 2022

Publiciado em 31/05/2021 as 07:00

Esqueça o que eu fiz nas eleições e nos governos passados. É com esse lema que muitos caciques políticos do Nordeste —que apoiaram e até fizeram parte dos governos do PT de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff— estão hoje aliados ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido).

Longe de serem apoiadores orgânicos a pautas de costumes ou de armamento civil, eles ajudam a dar sustentação ao governo. Em troca ganham afagos com obras e projetos em seus redutos eleitorais.

A busca de Bolsonaro por nomes fortes na região tem uma explicação clara: perdeu as eleições em 2018 em todos os nove estados nordestinos e é onde enfrenta a maior rejeição do seu governo.

Assim como os nove governadores são de esquerda e fazem clara oposição ao presidente, o que não falta é político contra os chefes dos Executivos estaduais que estão ao lado do presidente.

Paixão recente

Um caso clássico é o do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que integrou por muito tempo a base do PT. Hoje, é fiel escudeiro do bolsonarismo.

Nos bastidores, cogita-se que ele possa sair candidato ao Senado em 2022, embora muitos apostem na tentativa da reeleição. A saída como postulante ao governo em Alagoas é praticamente descartada.

Do mesmo estado e de olho na reeleição de 2022, o senador Fernando Collor (Pros-AL) também aderiu mais recentemente ao bolsonarismo.

Em visita recente de Bolsonaro a Alagoas, no último dia 13, Collor tentou colar no público bolsonarista até a máscara deixou de usar. Tudo porque sabe que terá vida dura na reeleição se disputar contra o atual governador, Renan Filho (MDB) —que contará com eventual apoio de Lula.

Pulando de governo em governo

O senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), que chegou a ser ministro da Integração Nacional da presidente Dilma (entre 2011 e 2013), hoje é líder do governo Bolsonaro no Senado.

FBC, como é conhecido, deixou o cargo porque seu padrinho político, o falecido ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos, rompeu com Dilma para se lançar candidato a presidente em 2014.

Em 2018, foi líder no Senado do governo Michel Temer (MDB). Hoje, defende que seu filho e prefeito de Petrolina, Miguel Coelho (MDB), seja candidato ao governo do estado, contra o seu ex-PSB, que governa o estado desde 2007.

No Piauí, outro bom exemplo é o senador Ciro Nogueira, presidente do PP e que hoje integra inclusive a tropa de choque do governo na CPI da Covid. Ela já anunciou que pretende disputar o governo do estado e quer ocupar a cadeira do seu ex-aliado, o petista Wellington Dias. Nogueira fez parte da base de apoio de Lula e Dilma.

 

No Maranhão, apesar de eleito junto —e com apoio— do governador Flávio Dino (PCdoB), em 2014, Roberto Rocha hoje é considerado um dos maiores representantes do bolsonarismo no estado e foi o anfitrião da visita do presidente ao estado na semana passada. Ele deixou o PSDB em março e pretende se filiar ao PSL. Quando eleito, em 2014, ele era do PSB.

Interesse em verbas e base

Para cientistas políticos ouvidos pelo UOL, a busca desses caciques nordestinos se justifica por questões locais e por facilitar a liberação de recursos a seus redutos. Mas o que não se sabe é se todos estarão com Bolsonaro em 2022.

"Essa movimentação [de apoio ao governo federal] é normal. O Poder Executivo, independentemente do presidente da República, exerce uma força centrífuga sobre os parlamentares. Ocorreu com o Lula, com Fernando Henrique, com Dilma. O que nós precisamos observar é se essas lideranças continuarão com Bolsonaro no próximo ano", explica o cientista político Adriano Oliveira, da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco).

 

Segundo ele, essas definições passarão muito pela popularidade de Bolsonaro quando forem fechadas as coligações.

"Se a popularidade do presidente mostrar a recuperação, obviamente essas pessoas irão se manter e outras virão. Mas, se continuar como está ou declinar, poderá ocorrer a saída de vários parlamentares da base", Adriano Oliveira, cientista político da UFPE

"É a popularidade que guia o apoio de um parlamentar a um presidente, prefeito ou governador. É uma lei natural da dinâmica política", completa.

Oliveira alega que outro grande desafio do presidente Bolsonaro na região é manter uma base partidária coesa pelo país, já que o lulismo tem sua maior força no Nordeste.

"Ele pode ter, por exemplo, um partido que o apoie em estados no Sudeste, como o PP, que aqui no Nordeste pode apoiar o presidente Lula. Será o grande desafio do presidente manter o apoio uniforme dos partidos políticos por conta do peso do Lula aqui", explica.

Poder dá mais poder

Para o cientista político Ranulfo Paranhos, da Ufal (Universidade Federal de Alagoas), sem uma base sólida na região ao assumir, o governo Bolsonaro não viu outra alternativa senão buscar parlamentares que historicamente circulam no chamado centrão, que não têm amarras ideológicas a nenhum dos lados polarizados.

"Bolsonaro não tem uma coalizão muito clara. Coalizões claras o que define é apoio do partido. No caso do atual governo, o apoio não é especificamente do partido, mas de parlamentares". Ranulfo Paranhos, cientista político da Ufal

Ele explica que os parlamentares buscam, com a aproximação, garantir atenção às suas bases locais. "Vamos partir do pressuposto de que todo político age no sentido de manutenção do status de reeleição, de conquista de voto. Para isso ele tem que fazer tudo: aumentar sua visibilidade, conseguir recursos através de projetos, construção, pavimentação. Enfim, ele precisa alimentar as suas bases", afirma.

Isso se acentua, diz Paranhos, no caso de deputados federais e senadores, que vivem fora dos seus estados. "De lá de Brasília, ele tem que dar visibilidade às suas ações, tem de fazer com que esse apoio seja visto para que seja convertido em voto", diz.

"Máquina faz diferença; apoio da máquina pública faz diferença na obtenção de voto. Ou seja, existe um efeito positivo e significativo sobre a conquista eleitoral quando você tem o apoio na máquina pública, seja do governo do estado ou federal", finaliza.

 

 

Do UOL