Uma pesquisa de iniciação científica realizada na Universidade Tiradentes (Unit) aponta para uma alternativa mais sustentável e menos poluente para o uso de tintas na construção civil: a produção de geotintas a partir de pigmentos extraídos da terra e misturados a insumos como cola branca e água. Esse foi o objetivo do estudo realizado pelas estudantes Júlia Carvalho Batista do Rosário e Maria Isabella Costa de Oliveira, ambas do oitavo período de Arquitetura e Urbanismo, e com orientação do professor Anderson da Conceição Santos Sobral, da área de Engenharias.
O trabalho, realizado em 2024 no âmbito do Provic (Programa Voluntário de Iniciação Científica da Unit), se debruçou sobre os processos e testes de preparação, aplicação e avaliação das geotintas no contexto da construção civil. Segundo as autoras, o objetivo principal foi desenvolver geotintas com ingredientes naturais e compará-las com tintas imobiliárias industrializadas, focando na ausência de substâncias químicas nocivas à saúde e ao meio ambiente.
Júlia explica que as geotintas são produzidas a partir de solos naturais, como argila, silte, e areia, que são usados como pigmentos e combinados com um aglutinante (a cola) e a água, que funciona como solvente. Tal combinação envolve um processo físico, sem auxílio de meio químico e com baixo uso de energia. “Elas são alternativas sustentáveis, já que não utilizam derivados de petróleo, são livres de compostos orgânicos voláteis (COVs), possuem menor impacto ambiental e preservam a identidade cultural e cromática local”, diz a aluna, frisando que as geotintas “podem ser usadas como revestimento em paredes internas, aplicações decorativas e acabamento final de baixo impacto ambiental”.
Os COVs são substâncias tóxicas presentes em solventes de tintas, vernizes e outros
materiais da construção civil. Em geral, elas são emitidas durante a aplicação do produto e em todo o período de ocupação de um edifício, cujo ar interno acaba afetado por um cheiro muito forte. Já as tintas naturais, consideradas como alternativa sustentável, são elaboradas a partir de elementos extraídos da natureza (de fontes animais, vegetais ou minerais) sem adição de produtos químicos, componentes sintéticos ou insumos derivados do petróleo.
A estudante conta que escolheu pesquisar mais profundamente o tema das geotintas pela relevância da sustentabilidade na construção civil, além do seu interesse em compreender alternativas que reduzam impactos ambientais e valorizem os materiais naturais. “Sempre me interessei por materiais, processos construtivos e sustentabilidade. A possibilidade de unir conhecimento científico e impacto social me motivou bastante”, disse ela, destacando o papel decisivo do professor Anderson Sobral em seu processo de escolha. “Ele já possuía interesse em aprofundar essa linha de pesquisa com geotintas e me apresentou o potencial científico, técnico e social desse material. A confiança dele no tema e o entusiasmo em orientar esse estudo foram decisivos para que eu me engajasse e acreditasse na importância do projeto”, lembra Júlia.
Como foi o estudo
Para a pesquisa, as alunas coletaram amostras de vários tipos de solo presentes em Aracaju e depois as trataram em processos de peneiração, moagem e decantação. Em seguida, promoveram ensaios de laboratório, aplicando proporções fixas de 50 gramas de solo (pigmento), 8 mililitros de cola branca (aglutinante) e três volumes de água (solvente), entre 20 e 30 mililitros. Nos testes, foram verificadas qualidades como aderência, textura, cobertura e secagem nas diferentes misturas. Já na aplicação das tintas em corpos de prova, avaliou-se critérios como textura, rendimento, tempo de secagem e cor, além da resistência às intempéries naturais (chuva, vento, etc), ao envelhecimento acelerado e ao surgimento de bolhas, manchas, fissuras ou descascamentos.
Em um dos resultados obtidos, o solo coletado apresentou: 3,72% de pedregulho, 35,5% areia e 60,78% silte + argila. De acordo com Júlia, uma amostra intermediária de 25 mililitros foi a que apresentou melhor textura, mais próxima da exigida pela norma NBR 15079, da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) que estabelece os requisitos mínimos de desempenho para tintas látex usadas em edificações não industriais nas cores claras. “A tinta teve boa cobertura, rendimento e secagem rápida. Não houve manifestação patológica após a aplicação. Em ambiente externo, a A2 se mostrou mais resistente. A cor final ficou na família 10YR (amarelo-laranja) da escala Munsell”, resumiu ela.
O estudo concluiu que “a tinta apresentou resultados positivos em termos de rendimento, cobertura, brilho e tempo de secagem, rendimento do produto evidenciando-se como uma excelente opção para aplicações que demandam qualidade e eficiência no processo de pintura”. Júlia acrescenta que as geotintas são relevantes principalmente em construções sustentáveis, projetos de baixo custo, habitação social e empreendimentos com foco em redução de emissões e poluentes. “A pesquisa contribui diretamente para o desenvolvimento de materiais de baixo impacto ambiental, oferecendo uma alternativa sustentável às tintas industriais que liberam COVs e prejudicam a qualidade do ar”, definiu.
A ideia é de que, em breve, a pesquisa seja transformada em artigo científico para apresentação em outros eventos ou publicação em uma revista científica especializada.
Autor: Gabriel Damásio
Fonte: Asscom Unit




