Presença ativa dos pais fortalece o autocontrole e reduz riscos na adolescência

Uma pesquisa recente mostrou que o envolvimento ativo dos pais no cotidiano dos filhos contribui para menor impulsividade e menor envolvimento com comportamentos de risco

Publicado em 06/08/2025 às 05:43

Jovens e adolescentes que têm seus pais ou familiares mais próximos e participantes de suas vidas, exercendo a chamada “supervisão parental”, tendem a desenvolver uma melhor capacidade cerebral de autocontrole, o que favorece a tomada de decisões e evita a adoção de comportamentos de risco, incluindo o cometimento de infrações, transgressões e até mesmo crimes. Esta é a principal conclusão de um estudo realizado por pesquisadoras da Universidade de São Paulo (USP). A pesquisa, que teve seus resultados divulgados recentemente, envolveu entrevistas feitas em 2022 com mais de 1,8 mil estudantes entre 13 e 17 anos, nas cidades de Ribeirão Preto e Sertãozinho, interior de São Paulo. 

 

Os participantes foram divididos em grupos com base na intensidade de supervisão parental recebida (monitoramento, diálogo e presença) e avaliaram o nível de autocontrole, o nível de impulsividade e a ocorrência de comportamentos de risco (uso de substâncias, envolvimento em brigas, etc.). Dos achados da pesquisa, destaca-se que os jovens com maior supervisão parental apresentaram menores níveis de impulsividade, maior capacidade de autocontrole e menor envolvimento em comportamentos de risco. 

 

Para a professora Luana Cristina Silva Santos, do curso de Psicologia e do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPED) da Universidade Tiradentes (Unit), o resultado reforça a teoria de que a supervisão familiar funciona como fator de proteção no desenvolvimento emocional e comportamental dos adolescentes. “A supervisão familiar tem um efeito direto no desenvolvimento de competências emocionais e comportamentais, como o autocontrole, a tomada de decisões seguras e a prevenção de comportamentos de risco. Crianças e adolescentes que vivenciam um ambiente com supervisão afetiva tendem a apresentar maior regulação emocional, menor envolvimento com substâncias psicoativas, menor evasão escolar e maior capacidade de planejamento futuro”, afirma.

 

Luana define a supervisão familiar como um conjunto de práticas parentais que envolve monitorar, orientar e estar presente de forma ativa na vida dos filhos, incluindo relação à rotina, círculos sociais, atividades escolares e de lazer Já o autocontrole é a capacidade de regular as emoções, cognições e comportamentos diante de estímulos, desenvolvendo-se a partir de fatores como maturação neurológica (do córtex pré-frontal por exemplo), experiências no decorrer da vida, ambiente social e cultural. E a impulsividade é associada a respostas emocionais rápidas e dificuldade de controle de comportamentos, constituindo-se em uma característica natural e de todo ser humano.

 

A idade dos impulsos?

 

A professora da Unit explica que a impulsividade tende a ser mais acentuada na infância e adolescência, visto que o próprio sistema neurológico ainda está em amadurecimento, o que cria uma maior dificuldade em exercer controle inibitório. Isso ajuda a explicar a ideia comum de que os adolescentes seriam mais “propensos” a adotar atitudes e comportamentos de risco. 

Esta “tendência”, conforme Luana, se deve a fatores biológicos e sociais da adolescência, um período marcado por mudanças hormonais, busca por identidade e reconhecimento social. “O córtex pré-frontal ainda está se consolidando, o que significa menor capacidade de inibição de impulsos. Além disso, os jovens estão construindo sua autoimagem, autonomia e pertencimento social, muitas vezes se distanciando da autoridade parental e se aproximando mais dos pares (amigos, grupos, redes sociais), o que oferece modelos, incentivos e pressões que podem também favorecer comportamentos de risco”, explica.

A adolescência também acentua a diferença entre dois sistemas presentes no funcionamento da mente humana: o “sistema de recompensa”, no qual o organismo libera neurotransmissores (como a dopamina) que produzem sensações de prazer e motivação a partir de estímulos como comer, ser elogiado, experiências novas, etc; e o “sistema de autorregulação”, que modula comportamentos e controla impulsos a partir do funcionamento do córtex pré-frontal, área do cérebro que atinge a maturação plena na fase adulta. 

Na adolescência, há um desequilíbrio natural entre esses dois sistemas o que vulnerabiliza o jovem a comportamentos de risco, isso torna essencial a presença de adultos que exerçam um papel mediador e regulador externo”, confirma Luana, pontuando que os “adultos que oferecem modelos consistentes, processo de regulação emocional favorecido de forma funcional no decorrer da vida e limites bem estabelecidos favorecem um bom desenvolvimento do autocontrole, o que reflete em comportamentos saudáveis de seguir normas, resistir a impulsos, lidar com frustrações, etc. 

Outros dois fatos complicadores podem impactar negativamente nesse cenário de transição dos comportamentos dos jovens: a sociedade que valoriza gratificações instantâneas, consumo rápido e exposição pública (especialmente nas redes sociais), e o fato de muitos jovens viverem em contextos em que não há canais abertos de comunicação com adultos significativos, favorecendo a busca por respostas ou validação em fontes externas, que nem sempre podem ser consideradas seguras ou saudáveis. 

Proteção ou privacidade?

Estas características e fatores da adolescência também explicam os constantes conflitos nas relações entre pais e filhos, principalmente na supervisão de suas atitudes e no estabelecimento de limites a serem obedecidos por quem busca mais autonomia na vida. O acompanhamento parental mais intenso, nessa fase, pode ser interpretado como falta de confiança e invasão de privacidade. A professora acredita que esses conflitos podem ser minimizados com atitudes baseadas em uma relação de diálogo contínuo entre pais e filhos, com respeito aos limites de privacidade, validação dos sentimentos e percepções da criança/adolescente e com fortalecimento da confiança. 

“Embora a adolescência seja uma fase sensível para tal temática, se o vínculo de confiança foi bem construído no decorrer da infância, é provável que a reatividade típica da adolescência seja mais suave e mesmo que os pais sejam aliados e não vistos como inimigos. No processo de supervisão familiar em que o jovem se sente acolhido, validado e orientado, ele tende a internalizar as regras e valores do seu modelo familiar, o que tende a ser fator protetivo inclusive no engajamento em comportamentos de risco”, conclui Luana. 

 

Autor: Gabriel Damásio

Fonte: Asscom Unit

Fatores biológicos e sociais tornam os adolescentes e jovens mais suscetíveis a comportamentos de risco, o que torna essencial a supervisão de familiares adultos. (Rovena Rosa/Agência Brasil)

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